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A tosse é um reflexo natural e vital do nosso corpo, uma guardiã silenciosa das nossas vias aéreas. No entanto, quando essa guardiã se torna excessivamente zelosa e persiste por semanas a fio, transforma-se num sintoma incômodo e, por vezes, debilitante: a tosse crônica. Definida formalmente como aquela que dura mais de oito semanas em adultos e mais de quatro semanas em crianças, a tosse crônica não é uma doença em si, mas um sinal de que algo pode não estar funcionando como deveria.

Embora comum, a experiência de viver com tosse crônica está longe de ser trivial. O impacto na qualidade de vida pode ser profundo. Noites de sono interrompidas levam à fadiga diurna. O esforço físico da tosse constante pode causar dores musculares no peito e abdômen, irritação na garganta e até incontinência urinária em alguns casos. Socialmente, a tosse persistente pode gerar constrangimento em reuniões, no trabalho ou em eventos sociais, levando ao isolamento. Psicologicamente, a frustração de não encontrar alívio e, por vezes, a falta de um diagnóstico claro, podem gerar ansiedade e impactar o bem-estar emocional.

Causas de Tosse

As causas por trás de uma tosse que se recusa a ir embora são diversas e, frequentemente, mais de uma pode estar presente ao mesmo tempo. Condições respiratórias como asma e bronquite crônica, o gotejamento pós-nasal (secreção que escorre do nariz para a garganta, muitas vezes por rinite alérgica), e a doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), onde o ácido do estômago retorna ao esôfago e irrita as vias aéreas, estão entre os culpados mais comuns. Surpreendentemente, em alguns casos, mesmo após uma investigação médica completa, nenhuma causa orgânica específica é encontrada – é a chamada tosse crônica idiopática ou funcional.

O tratamento convencional foca em identificar e tratar essas causas subjacentes. Xaropes antitussígenos, broncodilatadores para abrir as vias aéreas, anti-histamínicos para alergias, ou inibidores de ácido para o refluxo são ferramentas valiosas e eficazes para muitos. No entanto, existe uma parcela significativa de pacientes que, apesar de seguirem o tratamento recomendado, continuam a tossir. São os chamados pacientes com “necessidades não atendidas”, cuja tosse persiste, impactando suas vidas e gerando uma busca contínua por soluções.

É neste cenário de busca por alívio adicional que terapias complementares ganham destaque. Entre elas, a acupuntura, uma prática milenar originada na medicina tradicional asiática, tem despertado crescente interesse da comunidade científica ocidental. A acupuntura envolve a estimulação de pontos específicos no corpo, geralmente através da inserção de agulhas muito finas, com o objetivo de promover efeitos terapêuticos e restaurar o equilíbrio do organismo. Como essa técnica ancestral pode ajudar a acalmar uma tosse persistente? Vamos explorar a fisiologia da tosse e os mecanismos pelos quais a acupuntura pode oferecer alívio.

Entendendo o Reflexo da Tosse: De Protetor a Hiperativo

Para compreender como a acupuntura pode atuar, primeiro precisamos entender o que é a tosse. Essencialmente, a tosse é um mecanismo de defesa complexo e altamente coordenado. Sua função primordial é manter as vias aéreas – desde o nariz até os pulmões – limpas e desobstruídas. Pense nela como um sistema de segurança rápido e eficiente.

O processo começa quando minúsculos sensores, chamados receptores, localizados na mucosa do trato respiratório detectam algo errado: pode ser um irritante (como fumaça, poeira, um químico forte), um excesso de muco, um agente infeccioso, ou mesmo uma partícula de alimento que “desceu pelo buraco errado”. Existem receptores mecânicos, sensíveis ao toque ou distensão, e receptores químicos, sensíveis a substâncias específicas.

Uma vez ativados, esses receptores enviam um sinal de alerta através de nervos, principalmente o nervo vago, até uma central de comando no cérebro, especificamente no tronco cerebral (na região do bulbo), conhecida como “centro da tosse”. Este centro processa a informação e, se necessário, dispara uma ordem de ação através de nervos motores para um conjunto de músculos.

A resposta é a sequência clássica da tosse:

  • Inspiração Profunda: Uma rápida tomada de ar enche os pulmões.
  • Compressão: A glote (a abertura da laringe) fecha-se momentaneamente, enquanto os músculos do tórax (intercostais) e o diafragma se contraem vigorosamente. Isso aumenta drasticamente a pressão dentro do tórax.
  • Expulsão Explosiva: A glote abre-se subitamente, liberando o ar pressurizado dos pulmões a alta velocidade. Esse jato de ar funciona como um sopro poderoso que varre as vias aéreas, expulsando o que quer que estivesse causando a irritação ou obstrução.

Em condições normais, essa tosse é benéfica. É um reflexo protetor essencial que nos impede de sufocar e ajuda a prevenir infecções pulmonares, como a pneumonia. Uma tosse ocasional é perfeitamente saudável.

Quando o Reflexo se Desregula: A Tosse Crônica

Na tosse crônica, no entanto, esse sistema de defesa bem calibrado parece perder o controle. O reflexo torna-se hiperativo ou desregulado. Vários fatores podem contribuir para isso:

  • Hipersensibilidade do Reflexo da Tosse: Este é um conceito chave. Os nervos sensoriais nas vias aéreas tornam-se “exageradamente sensíveis”. É como se o “alarme” da tosse ficasse sensível demais, disparando por estímulos muito pequenos que normalmente seriam ignorados. Falar por muito tempo, rir, respirar ar frio, sentir um cheiro mais forte ou até mesmo mudanças de temperatura podem se tornar gatilhos para crises de tosse. Essa condição, por vezes chamada de síndrome da tosse crônica hipersensível, pode surgir após uma infecção respiratória (como uma gripe forte ou coqueluche) que, mesmo curada, deixa os nervos “irritados” por um longo período, ou devido a inflamação crônica de baixo grau.
  • Estímulo Persistente por Causas Subjacentes: As condições que mencionamos antes (rinite, asma, refluxo) mantêm o reflexo constantemente “ligado”. Na rinite alérgica, o gotejamento contínuo de muco na garganta irrita os receptores locais. Na asma, a inflamação e o estreitamento dos brônquios ativam receptores pulmonares. No refluxo, o ácido que sobe do estômago pode irritar diretamente a laringe ou ativar reflexos nervosos (via nervo vago) a partir do esôfago, mesmo sem chegar à garganta.
  • Ciclo Vicioso: A própria tosse repetitiva pode agravar o problema. O ato de tossir vigorosamente pode causar microtraumas e inflamação na garganta e vias aéreas, o que, por sua vez, aumenta a sensibilidade dos receptores e gera mais tosse. Cria-se um ciclo de auto-perpetuação: a tosse gera mais irritação, que gera mais tosse. É por isso que, às vezes, mesmo após tratar a causa inicial (controlar a alergia ou o refluxo), a tosse pode demorar a desaparecer completamente.

Compreender essa fisiopatologia – a combinação de hipersensibilidade nervosa, estímulos contínuos e o ciclo vicioso da inflamação – é crucial. O manejo eficaz da tosse crônica muitas vezes envolve não apenas tratar a causa raiz, mas também encontrar formas de “acalmar” esse reflexo hiperativo e quebrar o ciclo inflamatório. É aqui que intervenções como a acupuntura podem desempenhar um papel complementar interessante.

Como a Acupuntura Pode Influenciar o Controle da Tosse?

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Do ponto de vista da medicina ocidental moderna, os efeitos da acupuntura não são mais vistos como “mágicos”, mas sim como resultado de interações complexas com o sistema nervoso e a bioquímica do corpo. Quando uma agulha fina é inserida em um ponto de acupuntura específico – geralmente áreas ricas em terminações nervosas, vasos sanguíneos e células do sistema imune – ela cria um estímulo físico mínimo.

Esse estímulo viaja através das vias neurais (nervos periféricos) até o sistema nervoso central (medula espinhal e cérebro). Lá, desencadeia uma cascata de respostas, incluindo a liberação de diversas substâncias químicas. Os mecanismos propostos pelos quais a acupuntura pode ajudar a controlar a tosse crônica incluem:

  • Neuromodulação Central: Estudos demonstram que a acupuntura pode induzir a liberação de endorfinas e encefalinas no cérebro. Estas são substâncias opióides endógenas, os analgésicos naturais do nosso corpo. Além de aliviar a dor, elas podem ter um efeito modulador sobre os reflexos. Acredita-se que a acupuntura possa “elevar o limiar” do reflexo da tosse, tornando o centro da tosse no cérebro menos reativo a estímulos periféricos. Em termos práticos, isso significaria que seria necessário um estímulo mais forte (como uma quantidade significativa de muco ou um irritante real) para desencadear a tosse, reduzindo os episódios de tosse “desnecessária” causada por pequenos gatilhos. A liberação de outros neurotransmissores, como serotonina e noradrenalina, também pode contribuir para essa regulação neural.
  • Ação Anti-inflamatória: A inflamação crônica, seja nos brônquios (asma, bronquite) ou na garganta (gotejamento pós-nasal, refluxo), é um motor importante da tosse persistente. Pesquisas sugerem que a estimulação por acupuntura pode modular a resposta imune local e sistêmica. Observou-se que a acupuntura pode diminuir os níveis de citocinas pró-inflamatórias (como IL-6, TNF-α) e aumentar substâncias anti-inflamatórias em modelos experimentais e alguns estudos clínicos. Ao reduzir a inflamação nas vias aéreas, a acupuntura pode ajudar a “acalmar” a irritação que dispara o reflexo da tosse.
  • Regulação do Sistema Nervoso Autônomo: O sistema nervoso autônomo controla funções involuntárias como a respiração, a digestão e o tônus muscular das vias aéreas. Ele tem dois ramos: o simpático (“luta ou fuga”) e o parassimpático (“repouso e digestão”). Um desequilíbrio, como um tônus parassimpático excessivo nos brônquios, pode levar a broncoespasmo (fechamento das vias aéreas) e aumento da produção de muco, comuns na asma. Certos pontos de acupuntura parecem influenciar o equilíbrio autonômico, podendo promover relaxamento brônquico (broncodilatação) e regular a motilidade gastrointestinal. Esta última ação é particularmente relevante para a tosse por refluxo, pois há evidências de que a acupuntura pode melhorar o tônus do esfíncter esofágico inferior (a “válvula” entre o esôfago e o estômago) e acelerar o esvaziamento gástrico, reduzindo assim o refluxo ácido.
  • Modulação de Receptores Específicos (TRPV1): Pesquisas mais recentes investigam como a acupuntura afeta receptores neurológicos diretamente envolvidos na sensação de irritação e na tosse. Um alvo promissor é o receptor TRPV1 (Transient Receptor Potential Vanilloid 1). Presente nas fibras nervosas sensoriais das vias aéreas, ele é ativado por calor, ácido e substâncias irritantes como a capsaicina (o composto ativo das pimentas). Na tosse crônica, especialmente na síndrome da tosse hipersensível, o TRPV1 muitas vezes está hiperativado. Estudos em modelos animais (por exemplo, em cobaias com tosse crônica induzida) demonstraram que a eletroacupuntura (acupuntura com um leve estímulo elétrico) em pontos relacionados ao pulmão conseguiu reduzir a expressão e a atividade do TRPV1 nas vias aéreas, o que se correlacionou com uma menor frequência de tosse e menos inflamação pulmonar nesses animais. Embora mais estudos em humanos sejam necessários, esses achados pré-clínicos fornecem uma base molecular plausível para explicar como a acupuntura pode tornar as vias aéreas menos “irritáveis”.

Em resumo, a acupuntura parece atuar em múltiplos níveis para combater a tosse crônica: acalma os nervos hiperativos no cérebro e nas vias aéreas, reduz a inflamação local, reequilibra o controle autônomo da respiração e da digestão, e pode até modular receptores específicos de irritação. Essa abordagem multifacetada, apoiada por evidências científicas crescentes, explica como a estimulação de pontos específicos pode resultar em alívio sintomático para pacientes que sofrem com a persistência da tosse.

Tipos de Tosse Crônica e a Aplicação Clínica da Acupuntura

A tosse crônica não é uma entidade única; suas características e a resposta ao tratamento variam dependendo da causa subjacente. Identificar o tipo de tosse é fundamental para direcionar tanto a terapia convencional quanto a abordagem complementar com acupuntura. Vamos explorar os principais tipos e como a acupuntura pode ser adaptada a cada um:

1. Tosse Crônica Funcional (Idiopática ou Hipersensível)

Esta é a tosse que persiste sem uma causa médica claramente identificável após investigação exaustiva. Frequentemente ligada à síndrome da tosse hipersensível, pode ter começado após uma infecção viral e nunca ter desaparecido completamente. Pacientes descrevem uma sensação de “cócegas”, “irritação” ou “arranhado” na garganta que dispara a tosse. Pode piorar com o estresse, ao falar ou em ambientes específicos, mas caracteristicamente costuma desaparecer durante o sono. Em crianças, pode manifestar-se como “tosse hábito” ou síndrome da tosse somática.

Aplicação da Acupuntura: O foco aqui é modular a hipersensibilidade neurológica e reduzir fatores associados como ansiedade. A acupuntura visa “recalibrar” o reflexo da tosse, diminuir a percepção da irritação na garganta (possivelmente via endorfinas) e promover relaxamento geral. Pontos que acalmam o sistema nervoso e regulam o fluxo de energia (Qi, na MTC) na garganta e tórax são frequentemente usados. A acupuntura auricular (na orelha) também pode ser útil para modular o reflexo e o estresse. O objetivo é quebrar o ciclo vicioso da tosse e da irritação.

2. Tosse Crônica Alérgica (Associada à Rinite e Gotejamento Pós-Nasal)

Aqui, a tosse é frequentemente causada pelo gotejamento de secreções do nariz inflamado (rinite alérgica) para a garganta, irritando-a. Pode haver também um componente de hiperreatividade brônquica alérgica (uma forma leve de asma). A tosse pode piorar à noite ou pela manhã, e estar associada a outros sintomas alérgicos (espirros, coriza, congestão nasal). A causa raiz é a reação inflamatória a alérgenos (poeira, ácaros, pólen, etc.).

Aplicação da Acupuntura: A estratégia visa reduzir a inflamação alérgica nas vias aéreas superiores, aliviar a congestão nasal e diminuir o gotejamento pós-nasal. Pontos locais no rosto (perto do nariz e seios paranasais) e pontos distais (em braços e pernas) com ação sobre o sistema imune e as vias aéreas são escolhidos. Estudos mostram que a acupuntura pode reduzir sintomas de rinite alérgica, possivelmente modulando a liberação de histamina e outros mediadores inflamatórios. Ao melhorar a rinite, a causa direta da irritação na garganta é atenuada, levando à redução da tosse. Se houver componente asmático leve, pontos para relaxar os brônquios também são incluídos.

3. Tosse Crônica Inflamatória (Asma Variante da Tosse, Bronquite Crônica)

Neste grupo, a tosse é a manifestação principal de uma inflamação persistente nas vias aéreas inferiores. Na asma variante da tosse, a tosse crônica (geralmente seca, pior à noite ou com exercícios/ar frio) é o sintoma predominante, sem o chiado típico. Na bronquite crônica (comum em fumantes ou ex-fumantes, ou após exposição a poluentes), há inflamação e produção excessiva de muco nos brônquios, resultando em tosse produtiva (com catarro) na maioria dos dias.

Aplicação da Acupuntura: O objetivo é reduzir a inflamação brônquica, promover o relaxamento das vias aéreas (broncodilatação) e, no caso da bronquite, facilitar a expectoração (clearance mucociliar). Pontos no tórax e costas, relacionados à inervação pulmonar e à função respiratória, são priorizados. Acredita-se que a acupuntura possa modular a resposta inflamatória local e o equilíbrio autonômico nos pulmões. Pacientes relatam frequentemente menor frequência de crises de tosse e sensação de respiração mais fácil. Embora não elimine o catarro, pode ajudar a torná-lo mais fácil de ser expelido, “limpando” as vias aéreas.

4. Tosse Crônica por Refluxo Gastroesofágico (DRGE)

O retorno do conteúdo ácido (ou não ácido) do estômago para o esôfago e, por vezes, até a garganta (refluxo laringofaríngeo) é uma causa comum e muitas vezes subdiagnosticada de tosse crônica. A irritação pode ser direta (pelo ácido) ou indireta (por reflexo nervoso esôfago-brônquico). A tosse pode piorar após comer, ao deitar ou curvar-se, e pode vir acompanhada de rouquidão, pigarro ou azia, mas muitos pacientes têm apenas a tosse (“refluxo silencioso”).

Aplicação da Acupuntura: A abordagem foca em regular a função digestiva e reduzir o refluxo. Pontos no abdômen, pernas e braços relacionados ao estômago e esôfago são usados para melhorar a motilidade gastrointestinal (acelerar esvaziamento gástrico) e aumentar o tônus do esfíncter esofágico inferior, ajudando a manter o conteúdo gástrico no lugar. A ação sobre o nervo vago também pode diminuir o reflexo esôfago-brônquico. Ao reduzir os episódios de refluxo, a fonte de irritação das vias aéreas é controlada, aliviando a tosse. A redução do estresse induzida pela acupuntura também pode ser benéfica, já que o estresse piora o refluxo.

É crucial ressaltar que a acupuntura deve ser vista como terapia complementar. Ela não substitui a investigação médica para determinar a causa da tosse nem os tratamentos convencionais prescritos (como medicamentos para asma, alergia ou refluxo). Idealmente, a acupuntura integra-se a um plano de cuidados abrangente, potencializando os resultados e oferecendo alívio adicional, especialmente nos casos refratários.

Como é o Tratamento com Acupuntura na Prática?

Se você está considerando a acupuntura para sua tosse crônica, pode estar se perguntando como funciona o tratamento. Geralmente, o processo envolve:

  • Avaliação Inicial: O acupunturista fará uma anamnese detalhada, perguntando sobre a história da sua tosse (quando começou, características, gatilhos, tratamentos prévios), seu histórico médico geral, estilo de vida, sono e dieta. Ele também pode realizar um exame físico segundo os princípios da medicina tradicional chinesa (observar a língua, palpar o pulso).
  • Plano de Tratamento: Com base na avaliação e no diagnóstico (tanto médico ocidental quanto energético da MTC), o profissional definirá um plano de tratamento individualizado, escolhendo os pontos de acupuntura mais adequados para o seu caso.
  • Sessões: As sessões geralmente duram de 20 a 40 minutos. Você ficará deitado confortavelmente enquanto o acupunturista insere agulhas muito finas e estéreis em pontos selecionados (no tronco, membros, cabeça ou orelha, dependendo do caso). A maioria das pessoas relata sentir pouco ou nenhum desconforto; talvez uma leve sensação de picada inicial, seguida por uma sensação de peso, calor ou formigamento leve no local, ou um profundo relaxamento geral.
  • Frequência e Duração: Para tosse crônica, é comum iniciar com 1 a 2 sessões por semana. A resposta ao tratamento é avaliada após cerca de 4 a 8 semanas. Muitos pacientes começam a notar melhora na frequência e intensidade da tosse dentro desse período. Se houver benefício, as sessões podem ser gradualmente espaçadas (quinzenais, mensais) para manutenção. Se não houver melhora significativa após um ciclo inicial, o plano pode ser reavaliado.
  • Técnicas Associadas: Além das agulhas, o acupunturista pode usar outras técnicas, como moxabustão (aplicação de calor com erva Artemisia nos pontos), ventosaterapia, eletroacupuntura (estímulo elétrico leve nas agulhas) ou acupressão (pressão manual nos pontos). Para crianças ou pessoas com fobia de agulhas, alternativas como laseracupuntura (estimulação com laser de baixa intensidade) ou sementes auriculares podem ser usadas.

Evidências Científicas: O que Dizem os Estudos?

O interesse científico na acupuntura para tosse crônica tem crescido, resultando em um corpo de evidências que, embora ainda precise de mais pesquisas robustas, aponta para resultados promissores.

Revisões sistemáticas e meta-análises (estudos que compilam e analisam dados de múltiplos ensaios clínicos) têm sido publicadas. Por exemplo, uma revisão de 2025 que analisou 30 ensaios clínicos randomizados com quase 2.800 pacientes concluiu que a acupuntura e terapias relacionadas foram associadas a uma melhora significativa na gravidade da tosse e na qualidade de vida relacionada à tosse, em comparação com tratamento convencional isolado ou placebo. Notavelmente, em muitos desses estudos, a acupuntura foi usada como adjuvante, ou seja, em adição ao tratamento médico padrão, sugerindo que ela pode aumentar a taxa de sucesso terapêutico.

Analisando subgrupos específicos:

  • Asma Variante da Tosse: Uma meta-análise de 2021 indicou que a acupuntura melhorou os sintomas de tosse e a função pulmonar, além de reduzir a recorrência de crises após o tratamento.
  • Rinite Alérgica: Diversos ensaios, incluindo estudos ocidentais de alta qualidade, mostraram que a acupuntura pode melhorar os sintomas nasais, reduzir o uso de anti-histamínicos e, consequentemente, aliviar a tosse associada ao gotejamento pós-nasal. Algumas diretrizes internacionais já mencionam a acupuntura como opção adjunta para rinite.
  • Refluxo Gastroesofágico: Estudos mais recentes, alguns utilizando exames objetivos como manometria esofágica, sugerem que a acupuntura pode melhorar a função do esfíncter esofágico inferior e reduzir os sintomas de refluxo, incluindo a tosse. Os efeitos pareceram superiores aos da acupuntura “sham” (placebo).
  • Tosse Funcional/Idiopática: Embora haja menos estudos dedicados especificamente a este tipo, trabalhos em populações mistas de tosse crônica sem causa definida e evidências indiretas de estudos sobre ansiedade e síndromes de dor/sensibilidade sugerem um potencial benefício sintomático.

É importante reconhecer as limitações da pesquisa atual. Muitos estudos são da Ásia, levantando questões sobre generalização e potencial viés de publicação. O “cegamento” (garantir que nem o paciente nem o avaliador saibam quem recebeu o tratamento real) é metodologicamente desafiador em estudos de acupuntura. No entanto, o conjunto das evidências disponíveis, aliado ao perfil de segurança favorável da técnica, apoia a consideração da acupuntura como uma opção terapêutica válida, especialmente para pacientes com tosse crônica refratária ou que buscam abordagens complementares.

Segurança da Acupuntura e Cuidados Necessários

Um dos grandes atrativos da acupuntura é seu excelente perfil de segurança quando realizada por profissionais qualificados.

  • Efeitos Colaterais Comuns: São geralmente leves e passageiros. Incluem dor mínima ou sensação de pontada no local da agulha, pequenos hematomas, leve sangramento pontual na remoção da agulha, e sonolência ou relaxamento profundo após a sessão.
  • Riscos Sérios: São extremamente raros. A complicação mais temida, o pneumotórax (perfuração da pleura pulmonar), é evitável com técnica correta e conhecimento anatômico, sendo virtualmente inexistente nas mãos de praticantes bem treinados. Infecções são prevenidas pelo uso obrigatório de agulhas estéreis e descartáveis e assepsia adequada.
  • Precauções:
    • Informe o acupunturista se você usa anticoagulantes ou tem distúrbios de coagulação.
    • Gestantes podem fazer acupuntura, mas apenas com profissionais experientes em gestação, pois certos pontos são evitados.
    • Comunique se você possui dispositivos implantados (como marcapasso, onde a eletroacupuntura pode ser contraindicada).
    • Mantenha seu médico informado sobre o tratamento com acupuntura.
  • Escolha do Profissional: A segurança depende fundamentalmente da qualificação do acupunturista. No Brasil, diversos profissionais de saúde (médicos, fisioterapeutas, etc.) podem ter formação em acupuntura. Verifique as credenciais, a formação e se o local segue normas de higiene.

Em suma, a acupuntura é uma terapia minimamente invasiva com baixo risco de efeitos adversos significativos, tornando-a uma opção segura para a maioria das pessoas que buscam alívio para a tosse crônica.

Considerações Finais: Integrando Abordagens para Respirar Melhor

A tosse crônica é mais do que um simples sintoma; é uma condição que pode minar a energia, o sono, a confiança e o prazer de viver. Enfrentá-la exige persistência e, frequentemente, uma abordagem multifacetada. Enquanto a medicina convencional continua sendo a base para diagnosticar e tratar as causas subjacentes, a acupuntura emerge como uma ferramenta complementar promissora, apoiada por uma compreensão crescente de seus mecanismos de ação e por evidências científicas encorajadoras.

Ao modular o reflexo da tosse, reduzir a inflamação, equilibrar o sistema nervoso autônomo e até influenciar receptores específicos de irritação, a acupuntura oferece uma via para quebrar o ciclo vicioso da tosse persistente. Para muitos pacientes que não encontraram alívio completo com os tratamentos padrão, ela pode representar uma chance de reduzir a frequência e a intensidade da tosse, melhorar o sono e reconquistar qualidade de vida.

É essencial ter expectativas realistas. A acupuntura não é uma panaceia, e os resultados variam individualmente. O sucesso depende de um diagnóstico correto, da escolha de um profissional qualificado e da adesão a um plano de tratamento adequado, que deve sempre ser discutido com seu médico.

Referências

Morice AH, et al. ERS guidelines on the definition, evaluation and treatment of chronic cough in adults and children. Eur Respir J. 2020;55(1):1901136.

Lee JH, et al. Acupuncture-related therapy for chronic cough: A systematic review and meta-analysis. Integr Med Res. 2025;14(1):101121. (Nota: A data de 2025 pode ser um erro de digitação no original, mas foi mantida conforme fornecido).

Xiong J, et al. Acupuncture Treatment for Cough-Variant Asthma: A Meta-Analysis. Evid Based Complement Alternat Med. 2021;2021:6694936.

He M, et al. Acupuncture for allergic rhinitis: a systematic review and meta-analysis. Eur J M

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CRM-SP: 158074 / RQE: 65523 - 65524

Médico especialista em Fisiatria e Acupuntura. Área de Atuação em Dor pela AMB. Doutorado em Ciências pela USP. Pesquisador e Colaborador do Grupo de Dor do Departamento de Neurologia do HC-FMUSP. Diretor de Marketing do Colégio Médico de Acupuntura do Estado de São Paulo (CMAeSP). Integrante da Câmara Técnica de Acupuntura do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP). Secretário do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED). Presidente do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira de Regeneração Tecidual (SBRET). Professor convidado do Curso de Pós-Graduação em Dor da Universidade de São Paulo (USP). Membro do Conselho Revisor - Medicina Física e Reabilitação da Journal of the Brazilian Medical Association (AMB).