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O dry needling, ou agulhamento a seco, tem ganhado cada vez mais popularidade entre atletas de diversas modalidades. A promessa de alívio rápido da dor e aceleração da recuperação muscular atrai olhares curiosos e esperançosos. Mas, para além do burburinho, o que a ciência realmente comprova sobre a eficácia dessa técnica? Este artigo mergulha em uma recente e abrangente revisão sistemática para desvendar os mistérios do dry needling no contexto esportivo, oferecendo informações claras e baseadas em evidências para atletas, treinadores e entusiastas do esporte.

Desvendando o Dry Needling: Uma Agulha para Aliviar e Recuperar?

Para entender o impacto do dry needling, primeiro precisamos conhecer a técnica em si, seus mecanismos de ação propostos e por que ela se tornou uma ferramenta considerada no arsenal terapêutico esportivo.

O que é o Dry Needling? Uma Explicação Clara.

O dry needling é uma técnica terapêutica que envolve a inserção de agulhas finas e sólidas, ou seja, sem a injeção de qualquer medicação, diretamente em pontos-gatilho miofasciais (PGMs) ou em bandas musculares tensas. [1] Esses pontos-gatilho são popularmente conhecidos como “nós” musculares, que podem ser dolorosos ao toque e causar dor referida para outras áreas do corpo.

De acordo com a American Physical Therapy Association, o dry needling é uma intervenção qualificada, realizada por profissionais de saúde treinados, como fisioterapeutas, com o objetivo de tratar disfunções neuromusculares, aliviar a dor e melhorar a amplitude de movimento. [1]

É fundamental distinguir o dry needling da acupuntura. Embora ambas as técnicas utilizem agulhas semelhantes, seus princípios e objetivos são distintos. A acupuntura é um componente da Medicina Tradicional Chinesa e baseia-se na estimulação de acupontos localizados ao longo de meridianos de energia para restaurar o fluxo de “Qi” (energia vital). [1] Já o dry needling fundamenta-se na neuroanatomia e fisiologia ocidental, focando especificamente nos pontos-gatilho miofasciais e na sua relação com a dor e disfunção muscular. [1] Portanto, apesar da ferramenta ser a mesma, a filosofia e a aplicação clínica diferem consideravelmente, o que é crucial para que os pacientes entendam o tratamento proposto e alinhem suas expectativas.

Como o Dry Needling Funciona no Corpo do Atleta? Os Mecanismos por Trás da Agulha.

Acredita-se que o dry needling exerça seus efeitos terapêuticos através de uma série de respostas neurofisiológicas complexas. Não se trata de um efeito “mágico”, mas de interações biológicas que podem levar ao alívio dos sintomas. Os principais mecanismos propostos incluem:

  • Resposta de Contração Local (Local Twitch Response – LTR): A inserção da agulha no ponto-gatilho frequentemente elicia uma LTR, uma contração muscular involuntária e breve. Acredita-se que essa resposta ajude a “desarmar” o ponto-gatilho, reduzindo a tensão muscular, melhorando o fluxo sanguíneo local e diminuindo a concentração de substâncias inflamatórias. [1] Essa LTR é um sinal clínico que o terapeuta muitas vezes busca como indicador de que o ponto correto foi atingido.
  • Modulação da Dor: A estimulação provocada pela agulha pode ativar vias neurais que resultam na liberação de opioides endógenos, como encefalinas e endorfinas. [1] Essas substâncias são analgésicos naturais produzidos pelo próprio corpo, ajudando a reduzir a percepção da dor.
  • Aumento do Fluxo Sanguíneo Local: O agulhamento pode promover um aumento na circulação sanguínea na área tratada. [1] Isso facilitaria a chegada de oxigênio e nutrientes essenciais para a reparação tecidual e, ao mesmo tempo, auxiliaria na remoção de resíduos metabólicos e substâncias algogênicas (causadoras de dor) acumuladas no local.
  • Melhora da Amplitude de Movimento (ADM) e Redução da Rigidez: Ao aliviar a dor e reduzir a tensão nos pontos-gatilho, o dry needling pode contribuir para a melhora da flexibilidade e da amplitude de movimento da articulação envolvida. [1]

Compreender esses mecanismos pode aumentar a confiança do paciente no tratamento e desmistificar a técnica, mostrando que seus efeitos são baseados em respostas fisiológicas do organismo.

Por que Tanta Atenção no Mundo Esportivo? O Papel do Dry Needling para Atletas.

O dry needling tem ganhado destaque no cenário esportivo por diversos motivos. Atletas e equipes buscam constantemente estratégias eficazes para otimizar o desempenho, acelerar a recuperação e tratar lesões. Nesse contexto, o dry needling surge como uma opção com potenciais benefícios: [1]

  • Manejo da Dor: Seja dor aguda pós-treino ou competição, seja dor crônica associada a lesões por sobrecarga.
  • Tratamento de Lesões Musculoesqueléticas: Como coadjuvante na reabilitação de tendinopatias, contraturas, estiramentos musculares, entre outras.
  • Otimização da Recuperação: A vida de um atleta é marcada por treinos intensos e um calendário de competições muitas vezes congestionado, o que pode levar a um aumento das tensões musculares e diminuir a capacidade de recuperação completa entre as sessões. [1] A fadiga muscular induzida pelo treinamento pode, inclusive, causar a formação de pontos-gatilho que prejudicam a função muscular, aumentando a rigidez e reduzindo a força. [1]
  • Alternativa Não Farmacológica: Um dos grandes atrativos do dry needling é o fato de ser um procedimento que não envolve a administração de medicamentos. [1] Isso elimina os riscos de efeitos colaterais associados a anti-inflamatórios e analgésicos, além de ser uma consideração importante no contexto do controle antidoping. Para o atleta, isso significa uma opção que pode ajudar na recuperação e tratamento sem os riscos de substâncias proibidas.

Exemplos práticos incluem seu uso na reabilitação após cirurgias, como a de ligamento cruzado anterior (LCA), ou no tratamento de condições como a síndrome do impacto no ombro, além da sua aplicação para acelerar a recuperação muscular após esforço físico intenso. [1]

Dry Needling e o Alívio da Dor em Atletas: O Que a Pesquisa Revela?

Um dos principais motivos pelos quais atletas recorrem ao dry needling é o alívio da dor. A revisão sistemática analisada lança luz sobre a eficácia da técnica em diferentes contextos de dor: a dor muscular que surge após o exercício e a dor mais persistente, relacionada a lesões ou disfunções musculoesqueléticas.

Dor Pós-Exercício: Uma Solução Rápida para a Musculatura Cansada?

A dor muscular de início tardio (DMIT), aquela sensação de “quebra” que aparece um ou dois dias após um treino intenso, é uma velha conhecida dos atletas. Muitos se perguntam se o dry needling poderia ser uma solução rápida para esse incômodo.

Os achados científicos sobre este ponto são, no entanto, inconsistentes. [1] Alguns estudos demonstraram resultados positivos. Por exemplo, um estudo de Benito-de-Pedro e colaboradores reportou uma redução de 26,2% no limiar de dor à pressão (ou seja, os músculos ficaram menos sensíveis ao toque) após o tratamento. [1] Outro estudo, de Walsh e colegas, observou reduções entre 4,3% e 10,7% no limiar de dor à pressão em comparação com grupos controle. [1]

Por outro lado, outras pesquisas não encontraram benefícios significativos. Um estudo com corredores realizado por Cushman e sua equipe não revelou melhora na DMIT ou na frequência de cãibras em comparação com um tratamento simulado (placebo). [1] Da mesma forma, estudos de Dos Santos et al. e Huguenin et al. também não demonstraram efeitos superiores do dry needling em relação aos grupos controle para dor pós-exercício. [1]

Essa variabilidade nos resultados pode ser atribuída a múltiplos fatores, como as diferentes respostas fisiológicas de cada indivíduo ao exercício, o momento em que o dry needling é aplicado (logo após o treino ou horas depois), o nível de condicionamento físico do atleta, a intensidade e duração do exercício realizado, e até mesmo a percepção individual da dor. [1] Assim, o dry needling não parece ser uma “bala de prata” garantida para a dor muscular generalizada pós-exercício, e as expectativas devem ser realistas.

Tratando Lesões e Dores Musculoesqueléticas: Onde o Dry Needling Realmente Brilha?

Quando o foco se volta para o tratamento de dores mais específicas, como aquelas originadas por lesões ou disfunções musculoesqueléticas crônicas (dor no ombro, cotovelo de tenista, dor lombar, dor patelofemoral), o dry needling parece mostrar uma eficácia mais consistente e significativa. [1]

Nesses cenários, diversos estudos relataram reduções expressivas na dor. Por exemplo:

  • Ceballos-Laita et al. encontraram uma impressionante redução de 82,5% na intensidade da dor em atletas com dor no ombro. [1]
  • Etminan et al. reportaram uma queda de 88,4% na taxa de dor em atletas com epicondilite lateral crônica (cotovelo de tenista). [1]
  • Zarei et al. observaram uma diminuição de 75,9% na pontuação numérica da dor em atletas com dor patelofemoral. [1]
  • Kheradmandi et al. verificaram que a combinação de dry needling com terapia manual resultou em uma redução de 62,5% na dor (avaliada por Escala de Classificação Numérica) em atletas com discinesia escapular. [1]

Um fator que pode explicar essa maior efetividade é a natureza mais localizada do problema. Em casos de lesão ou dor crônica, frequentemente há pontos-gatilho miofasciais bem definidos que contribuem para o quadro doloroso. O dry needling, ao visar diretamente esses pontos, pode ser mais eficaz. [1] Além disso, estudos que demonstraram melhorias significativas em atletas com dor ou lesões tenderam a utilizar intervenções mais longas ou com maior frequência de sessões (por exemplo, nove sessões ao longo de três semanas, ou vinte sessões em quatro semanas). [1] Isso sugere que, para condições mais estabelecidas, um tratamento mais prolongado pode ser necessário para alcançar resultados ótimos.

Portanto, para atletas com lesões específicas e dor miofascial persistente, o dry needling pode oferecer um alívio considerável, especialmente quando integrado a um plano de tratamento mais amplo e com múltiplas sessões.

Contexto da DorNível de Evidência para AlívioExemplos de Achados (Redução da Dor)Fatores a Considerar
Dor Pós-Exercício (Generalizada)InconsistenteAlguns estudos: 26,2% (Benito-de-Pedro et al.); 4,3-10,7% (Walsh et al.).
Outros: Sem diferença significativa vs. placebo/controle (Cushman et al., Dos Santos et al.).
Tipo de exercício, intensidade, tempo de aplicação do DN, características individuais.
Lesão/Dor Musculoesquelética Crônica (Localizada)Promissor/Forte82,5% (Ceballos-Laita et al. – dor no ombro)
88,4% (Etminan et al. – cotovelo de tenista)
75,9% (Zarei et al. – dor patelofemoral)
Presença de pontos-gatilho definidos, duração e frequência do tratamento (geralmente múltiplas sessões).

Além da Dor: O Dry Needling Melhora o Desempenho Atlético?

Muitos atletas buscam o dry needling não apenas para aliviar a dor, mas também com a esperança de obter uma vantagem competitiva, seja através do aumento da força, da melhora da flexibilidade ou de outras adaptações fisiológicas. Mas será que as agulhas realmente entregam esses resultados?

Força Muscular e Potência: Há Ganhos Reais com as Agulhas?

Apesar do interesse, a evidência científica atual sugere que o dry needling, de modo geral, *não* leva a ganhos significativos na produção de força muscular ou potência em atletas. [1] Diversos estudos investigaram essa questão:

  • Ceballos-Laita e colaboradores não encontraram diferença significativa na força de rotação do ombro em jogadores de handebol após o tratamento com dry needling, em comparação com um grupo controle. [1]
  • Etminan e sua equipe também não observaram efeitos significativos na força de preensão manual em atletas com cotovelo de tenista. [1]
  • Em bailarinos com dor na panturrilha, Janowski et al. não identificaram melhora no torque (uma medida de força rotacional) do tríceps sural. [1]

Um estudo de Devereux et al. apresentou um achado interessante: embora a força máxima e a potência não tenham melhorado, a altura do salto vertical aumentou 48 horas após a intervenção em um grupo específico de atletas que recebeu dry needling no músculo gastrocnêmio. [1] Isso pode sugerir um efeito indireto ou específico ao contexto, talvez pela redução da rigidez muscular ou melhora da coordenação após o alívio de um ponto-gatilho limitante, mas não um aumento direto da capacidade contrátil do músculo.

Assim, é mais provável que qualquer melhora na força observada após o dry needling seja secundária ao alívio da dor, permitindo que o atleta treine ou se mova com mais eficiência, e não um efeito direto da agulha no aumento da capacidade de gerar força. Atletas não devem buscar o dry needling esperando um “boost” direto na força; seu papel parece ser mais na remoção de barreiras (dor, restrição) ao desempenho.

Amplitude de Movimento (ADM): Mais Flexibilidade e Mobilidade para Atletas?

A melhora da amplitude de movimento (ADM) parece ser um benefício mais consistentemente associado ao dry needling, especialmente quando há uma restrição de movimento devido a pontos-gatilho ou tensão muscular associada à dor ou lesão. [1] Acredita-se que a LTR e o relaxamento muscular subsequente possam reduzir o tônus e a tensão, permitindo maior flexibilidade. [1]

Estudos em atletas com dor ou disfunção musculoesquelética preexistente mostraram resultados promissores:

  • Ceballos-Laita et al. encontraram melhorias significativas na ADM do ombro (rotação interna, rotação externa, extensibilidade) em atletas com dor nessa articulação. [1]
  • Haser e colegas observaram melhorias na resistência muscular dos flexores do quadril e um aumento na ADM de flexão do quadril em jogadores de futebol. [1]

No entanto, em contextos de recuperação pós-exercício em atletas saudáveis, os resultados são menos consistentes. Por exemplo, Benito-de-Pedro et al. não encontraram diferenças significativas na ADM de dorsiflexão do tornozelo em triatletas após o exercício e a aplicação de dry needling. [1] Isso reforça a ideia de que o dry needling tende a ser mais eficaz para ADM quando há uma patologia ou disfunção de base a ser tratada. Para atletas saudáveis buscando apenas aumentar a flexibilidade geral, o dry needling pode não ser a primeira escolha.

Outros Efeitos no Corpo: O Que Mais a Ciência Observou? (Equilíbrio e Respostas Fisiológicas)

Além da dor, força e ADM, algumas pesquisas exploraram outros efeitos do dry needling:

  • Controle Postural e Equilíbrio: Achados interessantes surgiram em atletas com instabilidade crônica. López-González et al. observaram melhorias no controle postural estático (menor oscilação corporal) em jogadores de basquete com instabilidade crônica do tornozelo após o dry needling. [1] Zarei et al. também relataram melhorias no desempenho funcional, incluindo equilíbrio dinâmico, quando o dry needling foi adicionado ao tratamento fisioterapêutico convencional em atletas com dor patelofemoral. [1] Acredita-se que isso possa ocorrer devido à melhora da propriocepção (a capacidade do corpo de perceber sua posição no espaço) e do feedback sensorial. [1]
  • Respostas Fisiológicas (Temperatura, Citocinas, Pressão Arterial): A evidência sobre alterações fisiológicas sistêmicas induzidas pelo dry needling é limitada e, em geral, inconsistente. [1] Janowski et al. observaram algumas diferenças na temperatura da pele na área tratada, possivelmente devido à ativação de vias inibitórias da dor e vasodilatação local. [1] Estudos com atletas paralímpicos (Aidar et al., Dos Santos et al.) mostraram alguns efeitos na pressão arterial e nos níveis de interleucina-2 (uma citocina), mas o dry needling foi menos eficaz que a imersão em água fria para restaurar a força ou aumentar a espessura muscular. [1]

O impacto no equilíbrio em atletas com instabilidade crônica é um achado clinicamente relevante, sugerindo um papel do dry needling na reabilitação funcional. Contudo, os efeitos fisiológicos sistêmicos são menos claros e provavelmente não constituem o principal benefício da técnica. Não se deve esperar que o dry needling induza adaptações fisiológicas sistêmicas significativas por si só.

Para Quem o Dry Needling é Indicado no Esporte? Um Olhar Sobre os Participantes e Aplicações

Para entender melhor a aplicabilidade dos achados científicos, é crucial saber quem participou dos estudos e quais regiões do corpo foram mais comumente tratadas. Isso ajuda a contextualizar os resultados e a identificar para quem eles são mais relevantes.

Atletas em Foco: Quem Realmente Participou dos Estudos?

A revisão sistemática revelou que a maioria dos estudos sobre dry needling no esporte foi conduzida com populações específicas de atletas:

  • Nível Competitivo: A grande maioria das pesquisas (62,5%) envolveu atletas em nível de talento ou desenvolvimento (classificados como Tier 2) e atletas altamente treinados ou de nível nacional (Tier 3 – 20,8%). [1]
  • Lacuna na Pesquisa: Há uma escassez notável de estudos com atletas de elite ou de nível internacional/mundial (Tier 4 – apenas 4,2% dos estudos). Da mesma forma, atletas Paralímpicos foram incluídos em apenas dois dos estudos analisados. [1] A maior facilidade de recrutar participantes e os calendários de competição menos congestionados em níveis competitivos menores podem explicar essa tendência. [1]
  • Representação de Sexo: Um ponto positivo é a boa representação de sexo na maioria dos estudos. Muitos incluíram tanto homens quanto mulheres, e houve um equilíbrio razoável entre os estudos que focaram exclusivamente em um dos sexos. [1]
  • Variedade de Esportes: Os estudos abrangeram uma gama diversificada de modalidades esportivas, incluindo triatlo, corrida, handebol, futebol, balé, voleibol, powerlifting (paraplégico), entre outros. [1]

Essas características indicam que a evidência atual sobre o dry needling é mais diretamente aplicável a atletas em desenvolvimento e de nível nacional. A generalização dos resultados para atletas de elite ou Paralímpicos deve ser feita com cautela, dada a limitada base de pesquisa específica para esses grupos. Profissionais que trabalham com esses públicos precisam estar cientes dessa limitação.

Regiões do Corpo Mais Tratadas: Onde as Agulhas Geralmente Atuam?

Os estudos sobre dry needling em atletas tenderam a focar o tratamento em determinadas regiões do corpo com maior frequência:

  • Membros Inferiores: Foram o alvo principal na maioria das pesquisas, correspondendo a 58,3% dos estudos. Músculos como o gastrocnêmio (panturrilha) e os músculos da coxa foram frequentemente tratados. [1]
  • Ombros: A região do ombro também recebeu atenção considerável, sendo o foco em 20,8% dos estudos. Isso se justifica pela alta prevalência de lesões por sobrecarga e dor no ombro em esportes que envolvem movimentos repetitivos acima da cabeça, como vôlei, handebol e tênis. [1]
  • Lacuna Notável nos Isquiotibiais: Apesar da alta incidência de lesões nos músculos isquiotibiais (posteriores da coxa) em muitos esportes de corrida e salto, esta região não foi o foco predominante da pesquisa em dry needling. Os estudos tenderam a se concentrar mais no gastrocnêmio, possivelmente devido à prevalência de pesquisas com corredores, que frequentemente experimentam dor muscular nessa área. [[1] Page 1 (Key Points), Page 29]

O conhecimento atual sobre a eficácia do dry needling é, portanto, mais robusto para problemas localizados nos membros inferiores (especialmente panturrilha e coxa) e nos ombros. Há uma clara oportunidade e necessidade de mais pesquisas sobre a aplicação do dry needling em outras áreas comumente afetadas em atletas, como os isquiotibiais. Pacientes com problemas nos isquiotibiais devem saber que a base de evidências para DN nessa área é menos desenvolvida, embora a técnica possa ainda ser aplicada com base no raciocínio clínico do fisioterapeuta.

Benefícios Práticos e Pontos de Atenção do Dry Needling para Atletas

Traduzir os achados científicos em conselhos práticos é essencial. O que um atleta pode realisticamente esperar do dry needling e quais são os pontos que merecem atenção antes de optar por este tratamento?

O Lado Positivo: Como o Dry Needling Pode Ajudar Você, Atleta?

Com base na revisão da literatura, o dry needling pode oferecer alguns benefícios práticos importantes para os atletas:

  • Alívio Significativo da Dor: Este é, talvez, o benefício mais consistente, especialmente para dores relacionadas a lesões musculoesqueléticas e à presença de pontos-gatilho miofasciais específicos. [1]
  • Melhora da Função em Contextos Específicos:
    • Pode ajudar a melhorar a amplitude de movimento quando esta está limitada por tensão muscular excessiva ou dor. [1]
    • Em certos casos, como em atletas com instabilidade crônica do tornozelo, o dry needling demonstrou potencial para auxiliar no controle postural e no equilíbrio. [1]
  • Opção de Tratamento Segura e Não Farmacológica: Quando realizado por um profissional qualificado, o dry needling é geralmente bem tolerado, com baixo risco de efeitos adversos significativos. [1] O fato de não utilizar medicamentos é uma vantagem considerável no meio esportivo.

O principal benefício prático reside no alívio da dor, que, por sua vez, pode permitir uma melhor função e facilitar a participação plena nas atividades esportivas. Não deve ser encarado como uma cura para todos os males, mas como uma ferramenta útil dentro de um arsenal terapêutico mais amplo.

O Que Ponderar Antes de Optar pelo Tratamento: Pontos de Atenção Cruciais.

Gerenciar as expectativas é fundamental ao considerar o dry needling. Alguns pontos importantes a serem ponderados incluem:

  • Resultados Inconsistentes para Melhoria Direta do Desempenho: Atletas não devem esperar ganhos diretos e significativos de força, potência ou outras adaptações fisiológicas apenas com o dry needling, especialmente se estiverem saudáveis. [1]
  • Variabilidade na Eficácia para Dor Pós-Exercício Generalizada: A eficácia do dry needling para aliviar a dor muscular difusa que surge após treinos intensos não é garantida e pode variar consideravelmente entre os indivíduos. [1]
  • Necessidade de Dosagem Individualizada e Falta de Padronização: Os protocolos de tratamento (duração da sessão, número de agulhas, técnica de inserção) variam muito entre os estudos e na prática clínica. [1] O que funciona para uma pessoa pode não funcionar da mesma forma para outra, e não existe uma “receita de bolo”.
  • Importância de um Profissional Qualificado: A técnica deve ser sempre realizada por um fisioterapeuta com treinamento específico e certificação em dry needling para garantir a segurança e a eficácia do tratamento.
  • Não é uma Solução Isolada: O dry needling geralmente alcança melhores resultados quando integrado a um plano de tratamento abrangente, que pode incluir exercícios terapêuticos, terapia manual, educação do paciente e outras modalidades, conforme a necessidade individual.

Pacientes devem discutir abertamente suas metas e expectativas com o terapeuta e entender que o tratamento pode precisar de ajustes ao longo do tempo.

Dry Needling é Seguro? Efeitos Adversos e Considerações Importantes

A segurança é uma preocupação primordial para qualquer intervenção terapêutica. No caso do dry needling, a revisão sistemática indica que, quando realizado por profissionais treinados, é uma técnica geralmente segura, mas como todo procedimento invasivo, não está isenta de potenciais efeitos adversos.

Os efeitos adversos mais comuns são geralmente leves e transitórios, incluindo: [1]

  • Hematoma (equimose): Pequenas manchas roxas podem surgir no local da inserção da agulha.
  • Sangramento leve: Algumas gotas de sangue podem aparecer no ponto de inserção.
  • Dor durante ou após o tratamento: Pode ocorrer uma sensação de dor ou desconforto durante a inserção da agulha, especialmente se uma LTR for eliciada. Após a sessão, alguns pacientes relatam uma dor muscular semelhante àquela sentida após um exercício intenso, que geralmente desaparece em 24 a 48 horas.

Efeitos adversos significativos são considerados raros. [1] No entanto, a documentação desses eventos nos estudos revisados foi limitada. Apenas três dos 24 estudos analisados documentaram explicitamente os efeitos adversos. [1] Entre os casos relatados, incluem-se dois casos de hematoma local em um estudo, dor mínima e tolerável durante a inserção da agulha em outro, e, em um terceiro estudo, duas respostas sincopais (desmaio breve, com recuperação rápida) e um caso de dor torácica atípica que se resolveu após avaliação médica. [1]

Uma limitação importante apontada pela revisão é a inconsistência e, por vezes, a ausência de relato detalhado sobre efeitos adversos na maioria dos estudos. [1] Essa subnotificação dificulta uma avaliação completa e precisa do perfil de segurança da técnica em larga escala. Apesar disso, a percepção geral na literatura e na prática clínica é que o dry needling, quando aplicado corretamente por um profissional habilitado, possui um bom perfil de segurança. É crucial que os pacientes sejam informados sobre os possíveis efeitos colaterais leves e comuns e que comuniquem ao terapeuta qualquer preocupação ou reação inesperada.

Olhando para o Futuro: As Limitações da Pesquisa Atual e Próximos Passos

A ciência é um campo em constante evolução. Compreender as limitações da pesquisa atual sobre dry needling é fundamental para interpretar os resultados com um olhar crítico e para direcionar os esforços futuros de investigação.

O Que Ainda Precisamos Descobrir? As Lacunas na Ciência do Dry Needling.

Apesar do crescente corpo de pesquisa, a revisão sistemática identificou várias limitações e lacunas no conhecimento atual sobre o dry needling no esporte:

  • Risco de Viés nos Estudos: Muitas das pesquisas existentes apresentam um risco de viés metodológico. Frequentemente, isso se deve à falta de cegamento adequado dos participantes e dos terapeutas (ou seja, eles sabiam quem estava recebendo o tratamento real), e a detalhes insuficientes sobre como os participantes foram alocados para os diferentes grupos de tratamento. [1]
  • Falta de Padronização nos Protocolos: Existe uma grande variabilidade nos protocolos de tratamento utilizados nos estudos – como a dosagem (número de agulhas, profundidade de inserção), a técnica específica de agulhamento, a duração e a frequência das sessões. [1] Essa falta de padronização dificulta a comparação dos resultados entre diferentes estudos e a determinação de quais seriam os protocolos ideais para condições específicas.
  • Relato Inadequado de Detalhes Cruciais: Muitos estudos falham em relatar detalhadamente os procedimentos de tratamento, as dosagens exatas utilizadas e a ocorrência (ou ausência) de efeitos adversos. [1]
  • Populações Pouco Estudadas: Como mencionado anteriormente, há uma necessidade premente de mais pesquisas envolvendo atletas de elite, de nível mundial e atletas Paralímpicos, para entender se os achados atuais se aplicam a esses grupos. [1]
  • Ampliação do Foco em Regiões Corporais e Desfechos: É importante expandir as investigações para incluir uma gama maior de grupos musculares frequentemente lesionados em atletas (como os isquiotibiais) e avaliar um espectro mais amplo de desfechos neuromusculares e fisiológicos. [1]
  • Ausência de Estudos de Longo Prazo: A maioria dos estudos foca nos efeitos imediatos ou de curto prazo do dry needling. Há uma carência de estudos de coorte longitudinais que acompanhem os atletas por períodos mais longos para avaliar a sustentabilidade dos efeitos e possíveis consequências a longo prazo. [1]

Essas limitações não invalidam os achados positivos já existentes, mas sugerem que são necessárias pesquisas de maior qualidade metodológica para confirmar, refinar e expandir o nosso entendimento sobre o dry needling. O campo da pesquisa em dry needling ainda está amadurecendo.

A Importância de Estudos Mais Robustos para Guiar a Prática Clínica.

Para que o dry needling seja utilizado da forma mais eficaz e segura possível na prática clínica, é crucial que as futuras pesquisas busquem superar as limitações atuais. Isso implica em:

  • Melhorar a Qualidade do Relato: É fundamental que os pesquisadores adotem protocolos padronizados para relatar todos os aspectos do tratamento, incluindo detalhes da dosagem, da técnica de agulhamento e a ocorrência e manejo de quaisquer efeitos adversos. [1]
  • Desenhos de Estudo Mais Rigorosos: A condução de mais estudos randomizados controlados, com cegamento adequado de participantes e avaliadores, e com uma descrição clara do método de ocultação da alocação, é essencial para minimizar o risco de viés.
  • Foco na Replicabilidade: Os estudos devem fornecer detalhes metodológicos suficientes para que outros pesquisadores possam replicar os experimentos, o que é um pilar da validação científica.

Melhor pesquisa leva a diretrizes clínicas mais embasadas e, em última análise, a melhores resultados para os pacientes. A comunidade científica e os profissionais de saúde têm um papel importante a desempenhar na elevação do padrão da pesquisa em dry needling. Os avanços futuros na compreensão e aplicação desta técnica dependem diretamente da melhoria da qualidade da investigação científica.

Conclusão: Dry Needling no Esporte – Vale a Pena para Você?

Após analisar detalhadamente uma extensa revisão científica, podemos traçar um panorama mais claro sobre o papel do dry needling no esporte. A técnica demonstra ser promissora, principalmente no alívio da dor em atletas que sofrem com lesões ou dores miofasciais crônicas. Nesses contextos, também pode contribuir para a melhora da amplitude de movimento e do equilíbrio. [1]

No entanto, seus efeitos na melhoria direta da força muscular ou em adaptações fisiológicas significativas em atletas saudáveis são menos evidentes e, muitas vezes, insignificantes. [1] Para a dor muscular generalizada pós-exercício, os resultados são variáveis e não garantidos.

Em termos de segurança, o dry needling é geralmente considerado um procedimento seguro quando realizado por um fisioterapeuta qualificado e experiente, sendo os efeitos adversos mais comuns leves e transitórios, como hematomas ou dor local passageira. [1]

A decisão de utilizar o dry needling deve ser sempre individualizada. É crucial uma conversa aberta com um fisioterapeuta, considerando as necessidades específicas, o tipo de dor ou lesão, os objetivos do atleta e as evidências científicas disponíveis. O que funciona para um pode não ser ideal para outro, e a falta de padronização nos protocolos reforça a importância dessa abordagem personalizada.

O campo de pesquisa sobre dry needling no esporte está em franco crescimento, mas ainda há muito a ser explorado. Mais estudos de alta qualidade são necessários para solidificar as recomendações e otimizar a aplicação da técnica. [1]

Em suma, o dry needling pode ser uma ferramenta valiosa no arsenal terapêutico de atletas e fisioterapeutas, mas não deve ser encarado como uma solução única ou milagrosa. Uma abordagem informada e individualizada, frequentemente combinada com outras estratégias de tratamento e recuperação, é o caminho mais provável para alcançar os melhores resultados. A consulta com um profissional de saúde qualificado é o passo mais importante para determinar se o dry needling é adequado para você.

Referências

  • Kużdżał A, Kawczyński A, Trybulski R, Muracki J, Klich S, Clemente FM. Dry Needling in Sports and Sport Recovery: A Systematic Review with an Evidence Gap Map. Sports Med (2025) 55:811-844. https://doi.org/10.1007/s40279-025-02175-9

102f3369aa2f901f664d8264f90749cf0d7dc33726927668d4a69995475e2125?s=150&d=mp&r=g
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CRM-SP: 158074 / RQE: 65523 - 65524

Médico especialista em Fisiatria e Acupuntura. Área de Atuação em Dor pela AMB. Doutorado em Ciências pela USP. Pesquisador e Colaborador do Grupo de Dor do Departamento de Neurologia do HC-FMUSP. Diretor de Marketing do Colégio Médico de Acupuntura do Estado de São Paulo (CMAeSP). Integrante da Câmara Técnica de Acupuntura do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP). Secretário do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED). Presidente do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira de Regeneração Tecidual (SBRET). Professor convidado do Curso de Pós-Graduação em Dor da Universidade de São Paulo (USP). Membro do Conselho Revisor - Medicina Física e Reabilitação da Journal of the Brazilian Medical Association (AMB).