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Ensaio randomizado de acupuntura em pontos gatilhos em comparação a outras acupunturas para o tratamento da doença cervical crônica

A dor crônica cervical é um grande problema médico e social que causa desconforto severo e reduz a capacidade de trabalho. É causada por disfunções das estruturas do pescoço e geralmente é associada a alterações degenerativas inespecíficas como a osteoartrite. 

O tratamento inclui terapia medicamentosa, fisiatria, tratamentos manuais, imobilização, injeção local e epidural, e orientação ao paciente. Contudo, não há consenso quanto ao manejo ideal e muitos pacientes optam por métodos complementares, como a acupuntura, quando os tratamentos convencionais são ineficazes ou desconfortáveis.

Neste sentido, vários estudos pretendem determinar a eficácia da acupuntura na dor cervical crônica. Porém, seus resultados são contraditórios e carecem de desenho e metodologia adequados, incluindo controle adequado da qualidade da acupuntura administrada. Assim, o trabalho de Itoh et al busca defender que o sucesso de um ensaio depende da escolha e do número de acupontos tratados, e tem como objetivo avaliar os efeitos da acupuntura em pontos de gatilho na dor e qualidade de vida de pacientes com doença cervical crônica, em comparação com a técnica existente e amplamente utilizada em pontos de acupuntura padrão.

Para tanto, o estudo recrutou quarenta pacientes ambulatoriais (29 mulheres, 11 homens; faixa etária: 47-80 anos) do Departamento de Cirurgia Ortopédica da Universidade Meiji de Medicina Oriental, com CNP não irradiante por pelo menos 6 meses e exame neurológico normal da função do nervo cervical, incluindo reflexos profundos do tendão, ação muscular voluntária e função sensorial.

Os participantes foram randomizados de maneira simples-cega (1:1:1:1) em quatro grupos ao longo de 13 semanas, em que cada grupo recebeu duas fases de tratamentos de 3 semanas. O primeiro grupo recebeu tratamento com acupuntura tradicional (standard acupunture, SA) em acupontos padrão para dor cervical. Os pontos escolhidos da região cervical (pontos locais) foram GB 20 e 21, BL 10 e 11, S 12 e 13, enquanto na extremidade superior (pontos distais) foram TE 5, LI 4 e SI 3. 

O grupo seguinte recebeu acupuntura em pontos gatilhos (trigger point accupunture, TrP). Esta técnica requer experiência na apalpação e localização de bandas musculares tensas e pontos de gatilho miofasciais, sendo escolhidos neste estudo pontos gatilhos nos músculos esplênio da cabeça, trapézio, esternocleido, levantador da escápula, paravertebral e suboccipital. O agulhamento preciso de pontos gatilhos miofasciais ativos provoca uma breve contração das fibras musculares. Já o grupo com acupuntura em pontos não-gatilhos (non-trigger point, non-TrP) recebeu tratamento nos mesmos músculos que o grupo TrP, porém em pontos não-sensíveis, isto é, pontos sem sensibilidade ou sem banda muscular tensa.

O grupo controle (sham, SH) recebeu tratamento em pontos gatilhos, porém utilizou agulhas sem ponta para prevenir a penetração da pele. A simulação de extração de agulha foi realizada após 10 min, tocando o paciente e deixando cair agulhas ruidosamente em uma caixa de metal.

A avaliação do tratamento foi realizada através do uso de escala visual analógica (EVA), uma escala de dor de 0-100mm, e do Índice de Incapacidade Relacionada ao Pescoço (Neck Disability Index, NDI) , um questionário com variação de 0-50 pontos, sendo 50 a pior condição. 

Durante o decorrer do ensaio, alguns pacientes deixaram o estudo devido à falta de resposta ao tratamento ou aos efeitos adversos. Entretanto, não houve diferença significativa na taxa de desistência entre os grupos, e assim 31 pacientes completaram o estudo. 

Os escores EVA e NDI apresentaram tendência de queda durante o tratamento, contudo o grupo TrP apresentou queda significativa entre o pré-tratamento (EVA: 67.0 ± 13.2 mm, NDI: 13.0 ± 6.3) e após 3 semanas  (EVA: 18.6 ± 18.5 mm, p < 0.01; NDI: 3.9 ± 3.4, p < 0.01). Essa melhora foi observada por período e, ao final do tratamento, o grupo TrP reportou menor intensidade de dor em comparação aos demais grupos, que não apresentaram diferença significativa ao longo do tratamento. Portanto, os resultados sugerem a eficácia da acupuntura em pontos gatilhos miofasciais no tratamento da dor cervical crônica em pacientes mais velhos em comparação à acupuntura tradicional.

Ademais, esse ensaio levanta a questão da importância do delineamento experimental para a validação da acupuntura.

Demais estudos que buscaram avaliar a acupuntura na doença cervical crônica utilizaram diferentes grupos controle, como controles sem tratamento, sem penetração, acupuntura mínima (agulhamento raso e fraco), estimulação elétrica transcutânea, entre outras. Todavia, estes trabalhos obtiveram resultados contraditórios dependendo do controle escolhido. Assim, há a necessidade do desenvolvimento de um bom desenho experimental para controlar os efeitos placebos da acupuntura.

Além disso, diferentes parâmetros são essenciais para avaliar a eficácia da acupuntura, sendo eles o local, modo e intensidade do estímulo. O “local” do estímulo pode ser definido como a escolha do acuponto e sua localização. Este estudo mostrou que o efeito analgésico do tratamento em pontos gatilhos foi maior em comparação ao tratamento em acupontos tradicionais ou em pontos não-gatilhos. A intensidade do estímulo depende de diferentes variáveis, tais como o tamanho da agulha e seu local de inserção. Os pontos gatilhos miofasciais são locais onde nociceptores, como receptores do tipo polimodal, estão sensibilizados e, assim, a inserção nestes pontos gera a ativação de tais receptores, resultando em grande efeito de alívio da dor.

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CRM-SP: 158074 / RQE: 65523 - 65524

Médico especialista em Fisiatria e Acupuntura. Área de Atuação em Dor pela AMB. Doutorado em Ciências pela USP. Pesquisador e Colaborador do Grupo de Dor do Departamento de Neurologia do HC-FMUSP. Diretor de Marketing do Colégio Médico de Acupuntura do Estado de São Paulo (CMAeSP). Integrante da Câmara Técnica de Acupuntura do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (CREMESP). Secretário do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira para Estudo da Dor (SBED). Presidente do Comitê de Acupuntura da Sociedade Brasileira de Regeneração Tecidual (SBRET). Professor convidado do Curso de Pós-Graduação em Dor da Universidade de São Paulo (USP). Membro do Conselho Revisor - Medicina Física e Reabilitação da Journal of the Brazilian Medical Association (AMB).