A neuropatia periférica (NP) é uma desordem caracterizada pelo dano ao sistema nervoso periférico causado por uma lesão primária ou disfunção, com mononeuropatia envolvendo um único nervo ou polineuropatia envolvendo múltiplos nervos.
As principais mononeuropatias são a síndrome do túnel do carpo, causada pela desmielinização do nervo mediano do pulso, e a paralisia de Bell, a qual envolve o nervo facial e causa fraqueza na face.
A polineuropatia, por sua vez, possui etiologia diversa, porém suas principais causas são o diabetes, transtornos da tireóide, deficiência de vitamina B12, abuso de álcool, quimioterapia, e infecção por HIV. Contudo, cerca de um terço dos casos de polineuropatia periférica são considerados idiopáticos, ou seja, sem origem conhecida.
A polineuropatia periférica é geralmente acompanhada de parestesias dolorosas, que representam um grande desafio terapêutico. Por conta disso, terapias integrativas, como a acupuntura, têm sido amplamente usadas para o tratamento da dor neuropatia. Todavia, não havia avaliações críticas e sistemáticas dos efeitos da acupuntura na NP, tanto na mono quanto na polineuropatia.
Sendo assim, o objetivo dessa revisão foi examinar criticamente as evidências científicas publicadas quanto à segurança e eficácia da acupuntura no tratamento da neuropatia periférica de diferentes etiologias e seus sintomas associados, em comparação com a acupuntura sham e terapia convencional.
Para tanto, incluiu 15 artigos para análise, sendo 13 ensaios clínicos randomizados originais, um trabalho de acompanhamento a longo prazo e uma reanálise de um artigo previamente publicado.
Dentre as práticas utilizadas nos trabalhos, havia acupuntura com ou sem moxabustão, eletroacupuntura, e combinação de eletro e acupuntura manual, enquanto as demais intervenções foram medicação oral, injeções intramusculares/intravenosas, e imobilização.
Os trabalhos utilizaram dados de pacientes de diferentes nacionalidades, como China, Irã, Tailândia e Estados Unidos, com amostras que variaram de 16 a 480 pacientes. Já a duração dos tratamentos com acupuntura variou de 20 dias a 3 meses, com frequência diária a semanal.
Dessa forma, portanto, foi possível avaliar os efeitos da acupuntura nas diferentes formas de NP. Em pacientes neuropatia periférica diabética, os ensaios clínicos randomizados utilizaram acupuntura manual ou eletroacupuntura em combinação com injeções de lótus da neve em acupontos e injeções intravenosas de vitamina B12. Em comparação ao controle, que utilizou medicação controle oral, intramuscular ou intravenosa, os pacientes apresentaram melhora dos sintomas, exames neurológicos, condução nervosa e reologia sanguínea.
Já em relação à neuropatia relacionada ao HIV, uma reanálise de estudos prévios mostrou que tanto a acupuntura quanto o tratamento controle, amitriptilina no caso, resultaram em redução significativa do escore segundo a escala de dor de Gracely. Contudo, apenas a acupuntura resultou em um efeito sustentado a longo prazo. Todavia, tais efeitos benéficos não foram observados em pacientes com NP idiopática.
Em relação a mononeuropatias, o tratamento com acupuntura revelou melhora em diversos parâmetros. Nos pacientes com paralisia de Bell, os estudos mostraram melhora significativa na Escala de House-Brackmann e no índice de Incapacidade Facial.
Além disso, em artigos que analisaram pacientes com síndrome do túnel do carpo, a prática da acupuntura e eletroacupuntura resultou na melhora significativa de diferentes escores, tais como o Escore de Sintoma Global, Escore de Túnel do Carpo de Boston, Escala Visual Análoga, etc, em relação aos dados basais. Já em comparação aos grupos controles, a maioria destes trabalhos mostrou a maior eficácia sustentada da acupuntura em comparação com imobilização noturna, acupuntura sham, administração oral de vitaminas B1 e B6 e de prednisolona.
Nos pacientes com essas mononeuropatias, a acupuntura induziu mudanças na condução nervosa motora. O tratamento produziu efeitos significativos na amplitude do potencial de ação do músculo composto do nervo mediano, latência motora distal (LMD) do nervo mediano, e velocidade de condução nervosa motora (CNM) dos nervos mediano, ulnar e fibular.
Assim, em comparação com o controle de medicação, a acupuntura causou uma melhora significativamente maior no LMD e NCV mediano, ulnar e motor. Para mais, também se observou melhora na condução nervosa sensorial, pois a acupuntura resultou no aumento da amplitude do potencial de ação nervosa sensorial no nervo mediano, além de reduzir a latência sensorial do nervo mediano.
Ademais, os trabalhos não observaram efeitos adversos graves relacionados ao tratamento com a acupuntura. Os pacientes apresentaram eventos leves, tais como parestesias durante o procedimento, desconforto no local do agulhamento, dor após a sessão e pequenos hematomas. Sendo assim, pode-se afirmar a segurança e eficácia da acupuntura como terapia adjuvante ao manejo convencional da neuropatia periférica.
Esse trabalho, ainda, levanta questões sobre a padronização do número de agulhas, da modalidade de acupuntura, frequência de sessões, e da seleção dos pontos de acupuntura. Essas variáveis podem interferir nos resultados e, consequentemente, na conclusão acerca da eficácia da acupuntura. Para o tratamento das mononeuropatias, por exemplo, houve certa consistência na escolha dos pontos.
Os estudos com pacientes com síndrome do túnel do carpo utilizaram pontos no meridiano do pericárdio ipsilateral, sendo eles o PC6, PC7 e PC8; escolhidos devido a sua associação com o nervo mediano, além de também ter sido usado o LI4, frequentemente utilizado para dor facial.
Enquanto, para o tratamento da paralisia de Bell, foram escolhidos os pontos ipsilaterais do meridiano do estômago devido à sua proximidade com o ramos do nervo facial, sendo eles o ST2, ST4, ST6, ST7, GB 14, e novamente o LI4.
Já no tratamento das polineuropatias, no entanto, utilizaram uma variedade maior de pontos de acupuntura com pouca sobreposição. Assim, houve maior dificuldade em estabelecer uma associação entre a acupuntura e os resultados obtidos.
Dessa forma, evidencia-se a necessidade de maior investigação e padronização para minimizar as falhas metodológicas.